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Artigo: “A literatura e a orquestra de Vilhena”

A velha máxima, ‘me diga o que você lê e eu te direi quem você é’, parece cada vez mais atual. Existe um oceano de livros ofertado para o consumo do distraído público. Há obras que carregam nas capas nomes sugestivos e prometem organizar a vida dos incautos. Livros que dizem operar milagres. Pessoas sedentas pelo sucesso rápido podem ser facilmente fisgadas pela propaganda dourada de produtos de chumbo que afundam mais que libertam. O leitor apaixonado, pelo que parece ter sido escrito de encomenda para ele, ficará irado, se for alertado de que talvez esteja auto enganando. Por que não se deixariam levar por mensagens encantatórias de livros de autoajuda? São tão bonitinhos, capas caprichadas, letras bem feitas, boa encadernação e livro barato.

O tempo limitado que temos para leitura e a demora em realizá-la exigem escolhas. Grandes homens leem grandes livros. Um dos critérios de escolha pode ser aquele dado pelo escritor Osman Lins, o de que “[…] os grandes nomes da moderna literatura brasileira, os que com maior vigor tem fixado em suas obras a realidade nacional e a situação do homem perante o mundo […]”. Mas Osman Lins é pouco conhecido. Sua obra densa e instigante exige do leitor preparo, ou seja, não basta ser alfabetizado.

A qualidade da nação bem poderia ser avaliada a partir do que seu povo lê. Não conheço pesquisas no Brasil capazes de ligar desenvolvimento do povo e tipo de leitura, mas o problema é instigante: quão melhor é um país que lê melhor? O Brasil precisa ler mais, e melhor. Só ler mais para fazer a alegria de alguns editores gananciosos não basta.

Já de muito tempo, porém, se ouve dizer que a literatura ensinada na escola é maçante, cansativa, decoreba, em suma, um saco. Nomes consagrados pela crítica são xingados por preguiçosos. Pobre dos Alencar, Machado, Guimarães, Clarice. É mais cômodo reclamar do que escreveram, e, principalmente, do modo como escreveram. Poupa um bocado de esforço pedir que os livros didáticos e de leitura nas escolas tragam uma linguagem mais fácil para os alunos.  Pensar cansa.

O leitor esperto já deve ter percebido que aquelas leituras planas e leves, que não oferecem quase nenhuma dificuldade, tendem a deixar a pessoa na mesma.  Há certo contentamento em ler coisas assim, contudo só repetem o que o leitor já sabia ou poderia saber por si mesmo, dada a obviedade do que é dito. Por outro lado, textos mais densos são capazes de mostrar coisas ainda não pensadas pelo leitor e, até certo ponto, a dificuldade na leitura obriga ao exercício do raciocínio que aprimora o próprio modo de pensar de nossos jovens. Os livros fáceis, estilo autoajuda, podem ser um começo para lançar nossos jovens cérebros a aventuras mais instigantes. Mas o melhor é nem perder tempo com eles, e já começar com os consagrados, pois, como livros bobos, quem leu um leu todos, se não forem oferecidos logo outros de escopo literário mais aprimorado, o abandono da leitura é quase inevitável.

Tudo isso tem a ver com algo do qual é impossível medir em números, a famosa alma do povo, ou, para ser mais filosófico, o espírito do povo (volksgeist). Sociedade inteligente tende a fazer coisas inteligentes, entre as quais a principal é a que trata de cuidar da própria formação de sua gente. De certo modo é esse o sentido do que disse o maestro que conduziu a Orquestra Sinfônica de Vilhena. Uma cidade que mantém e prestigia a música de orquestra, complexa por si mesma, é sinal e promessa de prosperidade cultural de sua população. Confesso que senti orgulho de nossa cidade.

Ivanor-ArtigosÉ uma utopia boa pensar em 77 mil vilhenenses apreciando música instrumental de alto nível. É utópico em razão de que os ouvidos têm ficado surdos de tanto ouvir berros e gritos das músicas de sucesso comercial instantâneo e fugaz. Mas o número de apreciadores de música de orquestra aumentou, e é preciso insistir nesses requintes, para que os ouvidos se eduquem e, assim como a boa literatura, o que no começo parece difícil, tornar-se-á um prazer. Ficaremos então satisfeitos então em dizer quem somos.





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