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O encanto de Gilson Canuto Maciel; artigo do historiador Emmanoel Gomes

GILSON-Canuto[dropcap]P[/dropcap]ela tarde, por volta das cinco horas, cheguei à casa da Dona Astrogilda. Queria conversar com ela sobre os eventos marcantes de Vila Bela da Santíssima Trindade. Ela poderia falar de qualquer coisa. Eu estava ali, muito mais pelo prazer de estar ao lado dela que qualquer outra coisa. Saber das histórias era só um pretexto para me encontrar com tão maravilhosa personagem das barrancas do Guaporé lá no Mato Grosso.

Dona Astrogilda recebe todo mundo com muito carinho e disposição. Sua idade avançada há muito passou dos oitenta anos, não impede sua atuação como grande matriarca da cidade. Eu estava feliz da vida por poder ouvir sua voz, ver seus gestos, entrar em sua casa e contemplar o belo altar muito bem cuidado em sua sala. Tudo era revelador de uma vivência rica, impressionante.

Ela sorriu para mim e falou: menino, essa é a minha linda Vila Bela e eu sou dançarina do Congo. Sim, dona Astrogilda não perde um festejo. Na festa do Congo, dança alegremente contagiando a todos os seus filhos, os cidadãos de Vila Bela.

Que linda figura, um ar angelical, uma bondade que brota de todos os seus poros.

Tive a oportunidade de apresentar a ela um sobrinho que ela nem sabia da existência. Um sobrinho que é um grande orgulho para Rondônia, nascido em Guajará Mirim. Assim como ela, o sobrinho descende dos guerreiros quilombolas do Guaporé, filhos de Tereza de Benguela e João Piolho.

Estou me referindo ao amigo, irmão de tantas alegrias Gilson Canuto Maciel, nosso grande músico, militante da arte, história e cultura amazônica. Em minha militância cultural, os músicos sempre estiveram ao meu lado: Rogério Cabral, Junior Lopes, Baaribú Nonato, André Porto, Taiguara, John Kennedy, Bado, Zezinho Maranhão, Telêmaco, Miléo, Átila, Dione, Calango etc.

Os músicos de Rondônia sempre farão parte da minha vida e militância, e serão citados em vários artigos.

Viajei com o Gilson para muitos lugares, lembro de nossa estada em Guajará Mirim no Hotel Pacaás, pude aplaudir sua musicalidade dentro da piscina que fica bem no alto do hotel de onde podemos avistar a exuberante natureza amazônica e a união dos rios Pacaás e Mamoré.

Estive com o Gilson em Costa Marques onde visitamos o Real Forte Príncipe da Beira, sua música ilustrava minhas aulas, os alunos iam ao delírio. Por muitas vezes estivemos nas aulas na Estrada de Ferro Madeira Mamoré e Cemitério da Candelária.

Acompanhou-me nas aulas com os alunos dos extintos Coopeduc e GIZ, escolas e pré-vestibulares. Esteve presente nas aulas no colégio Classe A, Giga, Centro de Ensino Mineiro, Instituto Maria Auxiliadora, Pró-Ensino, alunos da FARO E UNIR.

Fizemos aulas no Barco Escola e sua musicalidade sempre presente. Em Vila Bela, primeira capital do Matogrosso, foi diferente, pois ocorreu um grande encontro mágico entre o Gilson e seus familiares. Todo mundo era parente do Gilson. Incrível o encontro as emoções de irmãs, tias, primos etc. Dona Astrogilda feliz em saber de seu sobrinho músico e querido em Porto Velho. Gilson cantou na Praça para Vila Bela da Santíssima Trindade, acompanhado por seu parceiro e grande baterista Junior Lopes, outra figura memorável do cenário musical e artístico de Rondônia, outro grande amigo de muitas batalhas.

Eu pude dialogar com Vila Bela sobre sua trajetória histórica. As pessoas sempre nos receberam com um carinho incomum. Nas oito viagens que fiz com meus alunos, e pretendo fazer muito mais, aquele momento era especial, pois um filho retornou as origens.

As famílias: Coelho, Leite, Canuto, Cambará, Melo, Maciel, Profeta, entre tantas outras que atuam na defesa do patrimônio histórico cultural de Vila Bela, verdadeiros guardiões das tradições, mitos e lendas do Guaporé, o acolheram com um profundo orgulho. Nosso filho, músico famoso, diziam algumas pessoas muito emocionadas.

Lembro-me da emoção, sinto ainda hoje, carrego nas lembranças, aquelas que ficam no coração, cada momento vivido nas aulas em Vila Bela com meus amigos, irmãos, parceiros e alunos.

Temos ainda, entre as pessoas de destaque uma figura linda, dona Memézia Profeta, que assim como dona Astrogilda é profunda conhecedora da cultura local e do Cangingin, bebida adocicada com forte poder afrodisíaco.

Aluno meu, sabe muito bem que aluno é estagio para ser amigo de verdade. A maioria absoluta dos meus alunos do ontem e hoje são pingos de luz em minha vida, minha batalha destemida por nossa história, cultura e educação.

Aproveito para desejar a todos muito, mas muito sucesso. A saudade é um sentimento gostoso que nos faz viver melhor em função das boas aventuras vividas. O Gilson Canuto Maciel é um cara daqueles que vive esse mundo para nos presentear.

Todas as pessoas que conheço e conhecem o Gilson sabem de sua grandiosidade humana. Seu talento vai muito além da música, seu talento é ser uma pessoa profundamente comprometida com o bem. Ele me chama de Cachorrão, é um jeito carinhoso que parte dos músicos de Porto Velho encontraram para celebrar as amizades. O cachorro é o melhor amigo do homem. Como vamos chamar o homem que se torna o melhor amigo do homem, Cachorrão. Assim foi e ficou. Tratamos-nos por cachorrões. Sem ser músico, fui aceito no canil apesar de ser vira-lata. O canil (sindicato) é presidido pelo Luis, sogro do Baaribú. Cada integrante tem sua raça, o Zezinho Maranhão é pincher, o Gilson rottweiler, o Junior Lopes será batizado logo, Baaribú é pitbull, o Bado dogão e assim vai. Eu só podia ser vira-lata.

Gostei, fui aceito por todas as demais raças. Certo dia, tentamos dar um golpe para tirar o Genrão da presidência do canil, não teve jeito, ele é o maior cachorrão, suportou o golpe desferido de forma violenta e abrupta. No preparativo do golpe, o Bado o distraiu enquanto o Baaribú, Gilson e eu, preparamos as bombinhas, daquelas de São João. A idéia era espantá-lo do Trono do Canil. Ele, como grande cachorrão que é resistiu, foi grande a tristeza e frustração. O Baaribú uivou por longas horas em função do nosso fracasso, O Bado bebeu como nunca, e eu passei a mancar mais, o Gilson ficou pretinho de raiva.  O Presidente do canil é poderoso mesmo. O Genrão, como o tratamos, é um ativo militante da música e poesia em Porto Velho, uma figura.

Emmanoel-Gomes-ArtigosCerta feita, em Machadinho do Oeste, a convite de outro cachorrão, figura extraordinária, John Kennedy, músico de primeiríssima linha, o Gilson se apresentou num belo Show, logo após atirou: Você vai ser membro do sindicato dos cachorros, vou falar com o Bado, Bariba, Junior, Zezinho, Genrão, Marão e companhia. Foi um presente e tanto. Foi assim que entrei para esse seleto e cobiçado grupo cultural. O primeiro vira-lata da confraria do canil.

Brincadeiras a parte, gostaria de homenagear meu amigo e irmão Gilson Canuto. Afirmar que sua musicalidade se harmoniza com centenas de outras vozes e sons na construção da musicalidade dessa terra. Seu trabalho já foi eternizado nos corações de centenas, milhares de pessoas que o citam como um dos melhores intérpretes da musica popular brasileira neste pedaço do Brasil.

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