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Rousseau e a universidade pública; artigo do professor Ivanor Luiz Guarnieri

A invocação de certas palavras como se elas tivessem poderes mágicos, capaz de afastar o mal e conceder as graças, é próprios da religião, não da ciência.

imp-ult-1205278390[dropcap]A[/dropcap] instituição que deveria ser o lugar próprio para o desenvolvimento da ciência e do espírito racional, às vezes é tomada de fanatismo que beira a grosseria. O decantado papel da universidade como instituição que pensa a sociedade, deveria começar a pensar seriamente sobre seu próprio papel, dizer a que veio e dar respostas eficazes aos problemas de ordem científica reclamados pelo conjunto da sociedade que, em última análise, arca com os custos de sua manutenção.

No caso brasileiro, parte do tempo é gasto em salas de aula fazendo aquilo que Max Weber denunciava como escândalo no trabalho do professor. Para Weber a cátedra não deve servir nem para fazer seguidores, nem para predizer o futuro.  Fazer seguidores é, entre outros, papel de políticos e predizer o futuro é atividade de magos e bruxos, não de professores. O que se permite é anotar consequências dentro de uma cadeia de relações de causa e efeito, particularmente útil para estudar elementos da natureza, não para fenômenos humanos, sempre escorregadios em suas manifestações.

Dito isso, e olhando brevemente a história de nosso País, os traumas vividos no período do Regime Militar (1964-1985), criaram um clima de animosidade contra a autoridade, confundida erradamente com autoritarismo. Imagina-se possível a autoridade sem autodeterminação própria e poder de mando, o que é loucura. Ela não deve extrapolar a lei, mas a autoridade deve fazer cumprir a lei e determinar aos subordinados a execução de ações em conformidade com as funções que os subordinados exercem. Dar ordens não é autoritarismo, ordenar é o ofício do sábio e saber mandar com Inteligência é obrigação de quem se dispõe a assumir cargos nas instituições, inclusive na Universidade.

Com medo de ser vista como autoritária, a universidade brasileira derramou sobre si a tinta da democracia. Veste-se como democrática, e para demonstrar isso realiza votação para tudo, do líder de turma, do representante dos acadêmicos, dos chefes de departamento, do diretor de campus, do reitor. As consultas constantes com votações as mais variadas, parecem demonstrar espírito democrático, mas não conseguem responder as perguntas sobre quem escolhe os candidatos aos cargos, e que interesses há em escolher este e não aquele professor para assumir determinados postos dentro da instituição universitária.

A universidade brasileira, pública, lutou contra a ditadura militar, certo? Nem toda ela. Isto é, alguns setores das instituições de ensino superior público saíram às ruas, protestando contra o autoritarismo do regime de 64. Em especial foram os alunos que tomaram a frente nas manifestações, arriscando-se a serem agredidos, como de fato ocorreu com alguns. Intramuros, porém, alguns professores, beneficiados pelo sistema implantado pelo Regime Militar não tinham a menor motivação (e porque teriam?) em lutar contra uma situação que os privilegiava.

 Hoje, um quarto de século decorrido desde o fim da Ditadura Militar no Brasil, a palavra mágica é invocada a todo instante: DEMOCRACIA. Mas uma palavra é uma palavra, e pode ser proferida sem convicção íntima. Além da democracia, deveria ser buscado o bem comum, não o interesse particular. Nesse sentido vale o alerta do filósofo Jean-Jacques Rousseau, na obra “Do Contrato Social”, quando adverte acerca de uma situação na qual “[…] os interesses particulares passam a se fazer sentir e as pequenas sociedades a influir na grande, o interesse comum se altera e encontra opositores […] todos guiados por motivos secretos, já não opinam como cidadãos, tal como se o Estado jamais tivesse existido, e fazem-se passar fraudulentamente, sob o nome de leis, decretos iníquos cujo único objetivo é o interesse particular”.

Ivanor-ArtigosDe tal modo que, para além da simples invocação da democracia, reduzida a mero depósito de votos em urnas as mais diversas, é importante saber que interesses se escondem entre os grupos em disputa por cargos e pelo poder de dar ordens na universidade. Enquanto isso o bem maior que é o ensino e a formação efetivamente acadêmica dos alunos fica meio perdido em meio à gritaria dos que querem se manter nos cargos ou dos que se opõe aos dirigentes universitários de plantão.

No caso da UNIR, de ambos os lados não basta invocar o nome da democracia, como uma palavra mágica. É necessária prática democrática, que implica o exercício do contraditório, ou seja, de argumentos consistentes e de apresentação de provas capazes de demonstrar quem de fato trabalha pelo bem comum, nesse caso pela melhor educação universitária no sentido mais científico do termo. O resto pode ser apenas interesse privado na universidade pública.




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