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Velho, meu querido velho; artigo do professor Ivanor Luiz Guarnieri

Tem aquela história do jovem que, ao recriminar um idoso, diz a ele: “você está por fora. Você foi criado num mundo sem computador, sem DVD, sem internet, um mundo atrasado…” e quando o jovem falante deu uma pausa o Senhor disse-lhe: “Exatamente, não havia nada disso, pois Nós, os Mais Velhos, estávamos construindo esse mundo que agora você, seu petulante, está usufruindo”.

[dropcap]A[/dropcap]s relações entre pessoas de diferentes gerações nem sempre são fáceis e parecem se tornar mais agudas as desavenças, na medida em que o mundo se modifica rapidamente. Em entrevista à revista Veja, de muito tempo atrás, Eric Hobsbawn, o Velho Historiador inglês, apontava para os dois mundos: um aquele onde viveram os velhos, outro o mundo em que vivem os jovens e, sendo mundos diferentes, os fazem ter dificuldades de compreensão mútua. Os jovens parecem ter muito mais futuro pela frente, enquanto, os velhos olham para trás, para o estoque do passado, de onde, às vezes, se inspiram para dar conselhos aos jovens sobre coisas que deveriam ter feito na juventude. ‘Ah, se eu tivesse sua idade e o conhecimento que tenho hoje’ costumam dizer alguns.

A juventude,  onde estará a tão decantada  fonte da juventude? Juventude, esse período maravilhoso da vida que a natureza desperdiça com os jovens, como ironiza Bernard Shawn. Alguns jovens, sempre prontos e desafiadores, querem parecer como a Sarça Ardente. Brilhantes, fortes, invencíveis. Mas o tempo, do qual ninguém escapa, vai esculpindo rugas, desenhando manchas na pele de uns, derrubando os cabelos de outros e a velhice chega. Venturoso aquele que não perdeu a vida antes da velhice chegar.

A questão é saber o que fazer com a velhice, na velhice, ou com os velhos. No Brasil do século XIX era comum os filhos, ao perceberem o envelhecimento dos pais, separarem um aposento da casa onde os velhos ficariam. Nasce daí a expressão aposentado tão comum atualmente. A senilidade poderia vir  acompanhada de doenças mentais que, na falta de um nome mais científico eram classificadas como caduquice. Estar caduco que inicialmente definia um estado mental de quem está alienado da realidade, como o tempo passou a significar também algo ultrapassado, fora de moda.

Claro que asilos existiam. Há notícias na Europa que o Papa Pelágio II que viveu entre 520 e 590 teria criado o primeiro asilo, ao receber velhos para serem cuidados em sua própria casa, que, assim, se tornou uma espécie de hospital para idosos. No Brasil, já em 1794 começou a funcionar uma casa que servia de abrigo para ex-militares de avançada idade, para os quais se planejou um lugar de descansar da tarefa de defender a Pátria, quando as forças já se esgotavam.

Também para velhos, mas não necessariamente militares, passou a funcionar por volta de 1890 o Lar ou Asilo São Luis, no Rio de Janeiro. Ir para lá era romper os laços com a família. Nesse quesito a história parece não ter mudado muito.

 A situação no Lar dos Idosos de nossa cidade faz um levantamento de velhos problemas bem conhecidos: abandono dos filhos, irritação dos anciões, agressividade. O trabalho árduo apontado pelo administrador do lugar poderia ser amenizado, talvez, por um pouco de afeto trazido por familiares que, em muitos casos, insistem em permanecer ausentes.

Ivanor-ArtigosCompromissos, trabalhos, vida atarefada e o tempo passando. Os Pais, vão ficando esquecidos para ‘quando der tempo’. A ingratidão ajuda mais um pouco e a morte abrevia a culpa. Convém, porém, não culpar os outros por atitudes que em outras circunstâncias poderiam ser nossas. Cada filho tem suas razões (ou desrazões) para o que faz ou deixa de fazer.

Talvez um desses anciões que se sentem abandonados no Lar dos Idosos, pudesse mandar um cobertor para o filho ou filha que insistem em não visitá-lo. Junto com esse cobertor poderia escrever um bilhetinho: “Filho, estou te mandando este presente, para que você possa usá-lo quando teu filho também te internar aqui. Com carinho Teu Pai, ou o que restou Dele”.

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