A vida humana, carregada de significados e relações, já foi comparada ao teatro, no sentido de que cada pessoa tem, ao longo do dia, diferentes papéis que cumpre de modo razoavelmente natural. Um mesmo sujeito pode ser pai, marido, filho, colega de trabalho, aluno e uma gama enorme de outros personagens reais. Aparentemente existe um ator dentro de cada um, a diferença é que alguns praticam mais a ponto de tornarem-se profissionais e serem reconhecidos como atores de fato.
A questão é saber em que hora do dia se está apenas consigo mesmo e se, nesses momentos, as impressões tiradas do dia a dia não interferem no conceito que a pessoa tem de si mesma. Noutro sentido, se os outros são nossos espelhos, em que medida as imagens transmitidas por eles não estão desfocadas a nosso respeito?
A busca pelo sentido da vida passa por essas questões e o problema começa pela definição de quem somos afinal. Há quem diga que a vida não faz sentido e que é justamente esse o seu sentido. Outros defendem que, sendo a vida dada por Deus, seguir Sua Lei é o que dá sentido à existência humana.
Mas, afinal, para que serve a vida? Seguramente para ser vivida. Mas como vivê-la? Nem é necessário se preocupar com isso, pois mesmo que se deixe simplesmente o tempo passar, a vida já estará sendo vivida. Todos têm em comum o fato de viver, mas cada um a seu modo, claro.
Seja a vida boa ou má, a quase totalidade das pessoas a ela se agarra. Alguns poucos, muito poucos, se suicidam, mas a maioria prefere continuar desejando ir para o céu, porém preferem ainda mais não morrer.
À medida que o tempo nos envelhece, as dimensões da vida se ampliam. O grande estoque do passado fica acumulado de lembranças. As revisões dos atos do passado, o orgulho dos acertos e os arrependimentos pelos erros cometidos, modificam a personalidade da pessoa, a ponto dela não reconhecer mais aquele jovem que havia sido há poucos anos. Não raro se surpreende pensando que agiria de modo muito diferente diante de certas situações, caso tivesse vinte anos a menos.
A pessoa talhada pelos golpes da vida aprimora seu comportamento. Torna-se um pouco mais comedido e, no palco das relações com os outros, ou se adapta ou corre o risco de ser riscada do script do teatro da existência. É necessário ser honesto e sincero com as pessoas, mas não agressivo. Evitar impor aos outros os pontos de vista pessoais, sabendo que estes podem estar errados. Coisas que só a maturidade de uma vida voltada para aprender com a própria existência pode ensinar.
É bom ter seriedade, mas sem querer levar tudo e todas as coisas sempre tão a sério. Convém saber rir das próprias falhas, percebendo que, de qualquer modo, não dá para levar a vida nos estreitos limites da seriedade, pois, de qualquer forma, não sairemos vivos da vida.
É curioso imaginar que pessoas de várias estirpes, que lutaram muito para conseguir as coisas que os homens adoram, ou seja, riqueza, fama, poder, de repente tudo se acabou para elas.
Essa coisa igualitária, verdadeiramente isonômica que é a morte, não poupa ninguém. Grandes filósofos, renomados cientistas, descobridores de novos mundos como Cristovão Colombo, todos são ilustres defuntos. Só em vida é possível criar. O que criaram não lhes valeu de nada para escapar da morte. Nem mesmo o dinheiro, pois, felizmente o tempo não pode ser comprado com dinheiro. Imagine a inveja de um poderoso que, pressentindo o término de sua existência, observa pessoas pobres, porém saudáveis, rindo-se de pequenas coisas, sem muito aborrecer-se com sua condição e tendo ainda anos de existência pela frente.
Quando se está em plena forma no exercício da vida, parece boba a ideia de que um dia não estaremos mais aqui. As lições do passado demonstram, contudo, que isso é inevitável.
Não é incrível como a morte nos leva a refletir sobre a vida? Como duas coisas coladas e amigas, vida e morte estão sempre presentes nas preocupações humanas. Quem morrerá primeiro? Quem será o próximo? É melhor nem pensar nisso e seguir vivendo no grande palco da vida, que, por si só, já é bem cheio de outros mistérios para além das preocupações com a morte.
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