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Covid-19: o que muda (ou não) no combate à pandemia com a nova variante do coronavírus no Brasil

Ilustração de um vírus e de cadeias de DNA
A variante B.1.1.7 apresenta 17 mutações, algumas delas na área responsável por codificar a espícula, a estrutura que permite o coronavírus invadir as células do corpo humano

O Brasil acaba de ter os primeiros casos confirmados de covid-19 provocados por uma nova variante do coronavírus.

A cepa B.1.1.7 foi detectada pela primeira vez no Reino Unido e já circula por outros 31 países. Os cientistas suspeitam que ela pode ser mais transmissível que as versões anteriores.

Os dois casos brasileiros foram identificados pela Dasa, empresa de medicina diagnóstica, que já comunicou a descoberta à vigilância sanitária e ao Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo.

Mas o que essa notícia significa na prática? A chegada da nova variante modifica de alguma maneira a prevenção, o diagnóstico ou o tratamento da doença? E as vacinas? Será que elas protegem contra essa cepa?

Perguntas sem respostas

Pelo que se sabe até o momento, a variante B.1.1.7 apareceu no Reino Unido entre o final do verão e o começo do outono no Hemisfério Norte (por volta dos meses de agosto e setembro). As primeiras notícias sobre sua existência foram publicadas no dia 20 de setembro.

Essa nova versão chamou a atenção por apresentar 17 mutações, algumas delas em sequências de genes que codificam as proteínas da espícula, a estrutura que fica na superfície e permite que o vírus invada as células humanas.

Outra observação que preocupou os especialistas foi a forma como a variante se espalhou rapidamente por algumas regiões do Reino Unido — em Londres, no início de dezembro, por exemplo, 60% dos novos casos de covid-19 detectados eram provocados pela B.1.1.7.

Isso levantou a suspeita de que esse coronavírus teria uma transmissão mais rápida e eficiente.

Essas informações foram suficientes para aumentar as restrições de circulação das pessoas em cidades como Londres. Em paralelo, dezenas de países começaram a vetar os voos vindos do Reino Unido.

Chegada ao Brasil

O estudo que detectou os dois primeiros casos da B.1.1.7 no país analisou 400 amostras de saliva por meio de um teste RT-PCR que busca três informações genéticas distintas do coronavírus.

Um dos alvos desse método é a proteína S, justamente a responsável por codificar a espícula da superfície viral.

“Na Inglaterra, os profissionais começaram a perceber que o RT-PCR de muitos pacientes estava encontrando dois alvos, mas davam resultados negativos para a proteína S. Por mais que as duas confirmações já fossem suficientes para fechar o diagnóstico de covid-19, levantou-se a suspeita de que havia mutações nos genes codificadores da espícula”, contextualiza o virologista José Eduardo Levi, coordenador de pesquisa e desenvolvimento da Dasa.

O trabalho brasileiro, que contou com o apoio do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP), fez uma revisão dessas 400 amostras e achou duas com esse mesmo padrão de resultado: dois alvos genéticos positivos e o gene da proteína S negativo.

“Na segunda-feira (29/12), identificamos os dois casos. Na terça, preparamos o material. Na quarta à noite já sequenciamos e confirmamos que eles realmente vinham dessa linhagem britânica”, explica Levi.

O especialista relata que conseguiu entrar em contato com um dos pacientes. “Ele me confirmou que esteve junto de pessoas que haviam chegado recentemente ao Brasil após uma viagem ao Reino Unido”.

O que muda na prática?

No meio de tantas incertezas, a palavra da vez é calma.

“Em resumo, o aparecimento de novas variantes não é surpresa e não muda em nada o que a gente precisa fazer para se proteger”, resume o virologista Paulo Eduardo Brandão, professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP.

Por ora, as recomendações de prevenção continuam exatamente as mesmas: manter distanciamento social, usar máscara ao sair de casa, limpar regularmente as mãos com água e sabão ou álcool em gel e sempre deixar os ambientes arejados e com boa circulação de ar.

Mudanças nos testes?

Quando o assunto é diagnóstico, a preocupação é um pouquinho maior. Como já dito, os testes RT-PCR detectam algumas informações genéticas específicas do coronavírus.

Se o patógeno sofre mutações importantes e começa a circular com grande frequência entre a população, há uma possibilidade de que alguns testes passem a falhar com mais frequência.

“Pode ser que apareçam mais resultados falso negativos, quando o paciente está com a infecção, mas o exame não a detecta”, explica Brandão.

Mulher usando máscara no trabalho
Usar máscaras, manter distanciamento de outras pessoas e lavar as mãos com frequência continuam como as principais medidas de prevenção, mesmo com a nova variante

Para evitar que isso aconteça, os laboratórios precisam ficar de olho e, se necessário, fazer os ajustes em seus equipamentos, insumos e materiais.

A própria Dasa, em parceria com o Instituto de Medicina Tropical da USP, está fazendo um estudo com essa nova variante para avaliar a eficiência dos testes diagnósticos utilizados atualmente.

Outras repercussões

Não dá pra ter certeza ainda se aquelas pessoas que tiveram covid-19 antes e se recuperaram estão imunes à B.1.1.7. Novos trabalhos precisam avaliar com mais profundidade essa questão.

“Em termos de reinfecção, a gente não sabe nada ainda. É provável que o Reino Unido possa observar alguma coisa a respeito disso nas próximas semanas, já que lá se encontram a maioria dos casos”, acrescenta Levi.

Em relação à doença em si, a nova variante não parece estar relacionada a quadros mais graves, mais tempo de internação ou a uma maior mortalidade pelo que tem sido observado até o momento.

E as vacinas?

Outra grande dúvida que surge na cabeça de todo mundo diz respeito à eficácia dos imunizantes que já foram aprovados ou estão em fase final de testes frente à nova cepa. Será que essas vacinas são capazes de proteger mesmo desta nova cepa?

“Até agora, as variantes não parecem ter capacidade de escapar das estratégias de vacinação”, tranquiliza Brandão.

Levi pontua que mudanças na proteína S do vírus podem interferir na eficácia das imunizantes, então é importante que as autoridades fiquem de olho nesse aspecto.

“O lado bom é que, mesmo que aconteça uma eventual perda de eficácia, os imunizantes já aprovados usam tecnologias muito modernas, que podem ser ajustadas de acordo com a necessidade”.

Profissional de saúde paramentado segura uma ampola e uma seringa de vacina contra a covid-19
Não se sabe até o momento se as vacinas mais avançadas ou já aprovadas em caráter emergencial são afetadas ou perdem eficácia com a nova variante

Muitos grupos de pesquisa trabalham justamente para detectar essas mudanças genéticas do vírus e antecipar possíveis problemas. Por ora, o que foi encontrado parece não colocar em xeque a eficácia das vacinas mais avançadas.

Além da variante do Reino Unido, há outras duas que são acompanhadas mais de perto pelos especialistas: a B.1.351, observada na África do Sul, e a B.1.207, na Nigéria.

André Biernath
Da BBC News Brasil em São Paulo





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