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Os gozadores do Charlie e as lições de Aristóteles

Todo mundo sabe da morte dos jornalistas franceses que trabalhavam para o jornal gozador, desculpe, para o jornal satírico Charlie Hebdo. De tanto fazerem caricaturas do Profeta Maomé, os fiéis muçulmanos reclamaram. Aliás, não era a primeira vez (nem é de hoje) que isso acontecia na Europa, culta e bela. Desta vez, no dezembro do já longínquo 2014, os fiéis agiram mais enfaticamente.

[dropcap]O[/dropcap] mundo se condoeu. Mas não o mundo todo, claro. Então, camisetas foram pintadas com a frase “Je suis Charlie” e os repórteres da TV brasileira repetiam pela milionésima vez que a tal frase significa “eu sou Charlie”.

Só no Brasil mais de 50 mil mortes em 2014. Poderíamos dizer, mortes violentas, mas vamos usar um eufemismo: mais de 50 mil mortes “não naturais”. Para esses dados pouca importância. Para os jornalistas franceses toda importância. Eles merecem, sem dúvida; eu que estou escrevendo para um jornal não sou nem louco de dizer o contrário.

Diziam nossos amados e prestativos noticiaristas que o atentado contra o jornal Charlie era um atentado à liberdade de imprensa, uma ameaça à democracia, entre outras bobásticas afirmações (a palavra bobástica não está errada, é apenas um neologismo querido leitor).

Homens têm sido degolados pelo chamado Estado Islâmico, e as autoridades do Ocidente reagem com a arma dos discursos. Reúnem a imprensa e declaram indignação e a necessidade de não deixar barato tal brutalidade. Nos olhos dessas autoridades, quando terminam o discurso, quase se pode ler: “até a próxima pessoal!”

E a outra vítima veio. Desta feita um japonês. O governo de seu país prometeu US$ 200.000.000,00 para combater o dito Estado Islâmico. Aí cai um japonês nas mãos deles e o que eles pediram: os mesmos 200 milhões de dólares ao governo do Japão. O primeiro ministro negou, dizendo que não cederia. E o desfecho foi trágico. Então a culpa pela degola do inocente foi culpa só dos radicais islâmicos? Não teria o governo do Japão e seu primeiro ministro nenhum pesinho na consciência? Exageremos: e se o refém fosse a mãe do primeiro ministro ou ele próprio, o governo japonês cederia? Não tem como saber. Não tem mesmo. Mas imaginar não paga imposto, ao menos por hora no Brasil da fome zero e corrupção não tão zero assim.

Quando ocorreu o episódio da morte dos jornalistas do Charlie, lembrei do filósofo Aristóteles. Tendo vivido na Grécia de antes de Cristo, este filósofo escreveu muito. Entre seus livros um tem especial interesse para o presente caso. Trata-se do “Arte Retórica”, ou simplesmente “Retórica”. Na segunda parte deste livro, Aristóteles ensina a evitar o ódio das pessoas. Para tanto, pergunta acerca de que tipos de pessoas nós não gostamos. E responde que não gostamos de pessoas que falam mal das pessoas que gostamos. Que não gostamos das pessoas que desprezam aqueles que amamos. Não gostamos de pessoas que fazem pouco caso daquilo que prezamos. Não gostamos de pessoas que nos tratam com desprezo (desdém). Enfim, não gostamos de pessoas que fazem pouco caso das coisas que temos em alta conta.

Então pergunto: como a Europa, culta e bela, esqueceu as lições de Aristóteles e passou a defender justamente as atitudes de quem despreza o que os muçulmanos amam? Fazer chacota com a fé dos outros é muita falta de educação. Eu fiquei pensando se fizessem isso com a imagem de Jesus ou de Maria ou de São José. Aliás, teve um pastor há muitos anos atrás que chutou a imagem de Nossa Senhora Aparecida, num programa religioso. Deu o maior quiproquó.

Os europeus falam de liberdade de imprensa. Mas, logo depois do evento Charlie, lembro das queixas da prefeita de Paris contra um jornal americano, cujo repórter mostrou o lado perigoso da cidade. Pois não é que o jornal teve que se retratar. Ato contínuo, o jornal da Globo mostrou a prefeita em entrevista, com ares de triunfo (nada a ver com o famoso arco), informando que o passo seguinte seria pedir indenização.

Ivanor-ArtigosEscrevi aqui sobre isso só para dizer que o jornal Charlie Hebdo está de volta à rotina de críticas de humor duvidoso. Na capa está o Papa Francisco. Mas, nós católicos não vamos reclamar, pois somos ocidentais e prezamos a liberdade de imprensa. Prezamos, desde que não mexam conosco e com as coisas que prezamos.

Antes que alguém acuse, alerto que, evidentemente não defendo a atitude de radicais que matam jornalistas. Não defendo e muito menos acuso. É mais que hora de procurar conhecer melhor os que tem outras ideias e professam outra fé.

No caso do Charlie Hebdo o que defendo é: leiam Aristóteles. Só isso, leiam Aristóteles.





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