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Artigo: Os homens e os animais e os homens com eles mesmos

homem-e-animalQuando se deu conta de que pensava o ser humano encheu os pulmões e estufou o peito, o orgulho o fez sentir-se mais seguro. “Sou diferente” não é um pensamento muito distante do primeiro sentimento do homem quando se comparou com outros seres vivos, ditos animais e disse desses que eram irracionais e que ele próprio era um ser pensante.

Séculos de existência provam que o primeiro desejo é o de manter-se vivo. Salvo os suicidas, o ser humano, mesmo em condições precárias para a manutenção de sua vida, estica o último músculo e busca a última chance para simplesmente continuar vivo. Na obra Gaia Ciência, Nietzsche afirmou sobre os homens: “[…] encontro-os sempre, a todos e a cada um, ocupados numa mesma tarefa: tornar-se úteis a conservação da espécie. E isto, não por amor a esta espécie, pura e simplesmente porque não há neles nada de mais antigo, mais possante, mais impiedoso e mais invencível do que esse instinto…”.

Por isso, disputa por coisas são tão constantes na vida humana quanto são os umbigos na barriga das pessoas. Mas, como umbigo cada um tem o seu, os homens variam um pouco em suas preferências. Fora as necessidades básicas, os outros objetos de desejo dependem da cabeça, é ela que faz o pescoço virar para um lado e não para outro. Quer saber como é uma pessoa, observe do que ela gosta. Quer saber mais ainda, veja como ela age. O gosto e a ação informam muito do tipo de pessoa com quem você está lidando.

As disputas pelos recursos escassos da natureza e a necessária proteção contra inimigos inclinou os homens a se unirem em bandos. Notando as vantagens de estarem próximos e viverem juntos, os homens suportaram as desavenças e intrigas que o convívio comum proporciona. A dar crédito às interpretações kantianas, as nações tem sua origem nesse desejo menos nobre de luta por conquista e defesa para não ser conquistado.

Na comparação com os outros animais, Aristóteles verá no homem um ser superior, devido à racionalidade. Afirma ele que a capacidade de pensar permite ao homem prever e assegura o direito de dispor dos animais para seu benefício próprio. Parece lógico pensar assim, mas se o distinto leitor lembrar que para esse filósofo grego os homens também estão divididos entre amos e servos e que os primeiros, sendo mais racionais, devem usar dos servos mandando neles, já se desconfia dessa classificação.

Outras possibilidades existem. Rousseau, por exemplo, afirma que a característica natural do homem é o sentimento, não a racionalidade. Ele não nega a razão humana, isso seria loucura, mas afirma antes o sentimento como natural. Ora o sentimento é algo comum entre homens e animais, logo é preciso respeitar a todos. Nada de abuso com os bichos, portanto.  Se isso faz sentido, encontra-se então a possibilidade de uma ética voltada para a relação entre homens e os outros animais. Já não se pode abusar deles, golpeando-os ou extenuando-os no trabalho.

Talvez o leitor possa achar isso estranho, afinal bicho é bicho. Mas programas de televisão e revistas impressas mostrando cenas de cachorros maltratados, cavalos esgotados a chicotadas, experimentos com animais abertos em cirurgias sem o devido cuidado, despertam a indignação da maioria, o que mostra que o sentimento humano não aceita maus tratos contra os animais.

Ivanor-ArtigosE quanto aos homens entre si? Ah sim. Nas disputas por riquezas, feitas como suposta garantia de sobrevivência, os homens se unem e são capazes de racionalmente preparar guerras, corromper e serem corrompidos, desviar recursos de creches, da saúde, da educação. Sabem (e como não saberiam) que prejudicarão crianças, doentes e alunos. Mas, nesse momento fala mais alto o frio cálculo racional, planejando cuidadosamente ações fraudulentas, em benefício próprio, conquistado riqueza de modo espúrio.  O sentimento humano fica então abafado pela cobiça.

Os animais, mesmo os mais ferozes, seguem as regras da natureza. Os homens, ao se relacionar com outros homens e agir com os animais, criam suas próprias regras.




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