Boa parte da elite fundiária brasileira construiu sua riqueza tendo por base a mão-de-obra escrava negra, e, ainda hoje, faz de conta que não sabe ou não viu, desconhecendo sua importância, não atuando no sentido de fazer justiça junto aos milhares de problemas gerados por essa discriminação histórica.
Ao longo de toda a história do Brasil, os governos foram, e ainda são dirigidos em sua maioria, por pessoas que aplicam políticas geradoras de desigualdades sociais, concentrando as riquezas nas mãos dos detentores de grandes posses rurais, em detrimento de uma infinita maioria que carece de quase tudo.
As pessoas que ocupam os grandes cargos nos Governos representam uma tradição elitista e, acima de tudo, branca, não atuando de forma eficaz no sentido de amenizar os problemas gerados por quatrocentos anos de escravidão e mais de cem anos de racismo velado.
Essa afirmativa é normalmente questionada por aqueles que estão no poder, mas podemos comprovar a ineficácia das políticas sociais no que diz respeito ao povo de origem africana.
Podemos citar vários exemplos de políticas incorretas, como o caso da cota para negros nas Universidades públicas, reconhecer que o povo de origem africana é incapaz de concorrer com o branco é mais uma forma de discriminação, é também tapar o sol com a peneira, não seria melhor reconhecer o fracasso da escola pública. A escola pública carente de qualidade atenta contra todos, não só contra o povo de origem africana, temos milhões de brancos pobres em condições de abandono total, é preciso uma política social compensatória para todos. A cota para negros alimenta o ódio e o racismo na medida em que um com notas baixas toma a vaga do outro que teve notas mais altas.
Sabemos e defendemos políticas que possam ajudar os mais pobres, somos contra qualquer política que divida, diminua, trate o outro como incapaz.
No Brasil todos, somos um poço Índio, Português e Negro, como definir cor em um povo tão miscigenado.
O resultado de tantas políticas compensatórias mal feitas são os bolsões de miséria espalhados nas periferias de todo o Estado Nacional, onde em meio aos seus habitantes, se destacam as populações empobrecidas.
A Ferrovia Madeira Mamoré foi concluída em 1912. Ficou com 364 quilômetros. Em 1922 recebeu mais dois quilômetros, totalizando 366. Por muito tempo foi o centro aglutinador de pessoas em nossa região, símbolo primeiro de nossa história, um grande mito fundador da Amazônia e, conseqüentemente, de Porto Velho, a atual Capital do Estado de Rondônia.
Devemos ter em nossas mentes e corações que entre os anos de 1872 e 1912, homens ferozes, destemidos, corajosos, em sua maioria sem rosto, nome e história, pois sobre eles, poucos sabemos, deram início a uma ferrovia. Não sabiam eles que, na verdade, estavam tocando o coração de várias gerações futuras, e, hoje, cidadãos de Porto Velho e Rondônia foram acolhidos em uma localidade erguida em meio ao desespero, dor, sofrimento, saudade, sonhos e esperanças de pessoas vindas de vários lugares do Brasil e do mundo, que há mais de cem anos se debateram contra uma selva desconhecida e perigosa, em busca de um mundo melhor.
Os trabalhadores viram de mais de quarenta países, eram gregos, indianos, chineses, árabes, portugueses, alemães, italianos, espanhóis, americanos e principalmente antilhanos.
A herança desses homens para todos os que aqui residem: o Estado de Rondônia.
Com as obras da ferrovia concluídas, as pessoas que habitavam os pequenos povoados amazônicos, que surgiram ao longo de seus trilhos, pressentiam que algo estava errado, e que infelizmente a grande mola econômica que dera impulso aos vários investimentos na região dava claros sinais de decadência.
A inexistência de uma política nacional e regional, preocupada com o controle de nossas fronteiras, com o combate ao contrabando de mudas, sementes e outros produtos, permitiu que os ingleses levassem, em 1876, de nossa região, milhares de mudas e sementes de Hevea brasiliensis, a seringueira. Planta que existia somente em território americano, propriedade biológica da nossa Amazônia e de todos os seus povos. No sudeste asiático, as mudas de seringueiras, foram cultivadas pelos ingleses que produziram com grande sucesso.
Os seringais, lá do outro lado do mundo, tão distantes de nossa região, passaram a produzir a goma elástica com mais eficiência, com melhores preços e facilidades para o transporte.
O estrago foi grande em nossa economia, a região, outrora rica e próspera, pelo menos para a elite local, passou a amargar crises e problemas, atingindo uma profunda decadência.
O mercado e o sistema capitalista, não possuem pátria, não se importando com as conseqüências terríveis sofridas pelas pessoas que habitam as regiões onde são provocadas as crises. Os grandes empreendimentos capitalistas mundiais procuraram as facilidades oferecidas pelos seringais Malaios que na época eram controlados pelos ingleses. O mais importante para esse regime econômico sempre foi o lucro e nada mais.
Na Amazônia ficou um povo sem perspectivas, e, em nossa região, uma estrada de Ferro sem motivações econômicas para seu perfeito funcionamento. Estrada única no mundo, com um nível de dificuldades humanas e financeiras em sua construção, jamais enfrentadas pelo homem em outra localidade.
Em meio a esse quadro, pessoas desencantadas em uma mistura de espanto, agonia e tristeza. De um momento de euforia e prosperidade ao desalento econômico, a prosperidade se foi rápido como uma chuva de verão.
Ao seu redor Porto Velho, o povoado que surgia, ia sentindo as influências das mudanças na economia, lentamente foi se acomodando com o apito, agora melancólico, do trem, seguindo seu ritmo, embalado pelo chacoalhar de seus vagões esquecidos.
Percival Farquar, que havia investido naquele projeto, antes tão promissor, percebeu o problema e tentou o mais rápido possível, se desfazer da ferrovia, acabando, mais tarde, por repassar a mesma para uma empresa Anglo- Canadense que já era concessionária da “Porto of Pará e Brasilian Railway” que eram, por sua vez, as maiores acionistas da Madeira Mamoré.